sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Crônicas do Dia - Amanheceres - Veríssimo

O amanhecer é uma metáfora pronta, e reincidente. Nós a usamos para escrever a História: o Renascimento como um novo dia depois da noite medieval

22/01/2017 - 09h05


Em inglês existe uma expressão bonita para dar-se conta, ter uma revelação, entender: “It dawned on me”. Amanheceu em mim.

A expressão descreve o sentimento de, subitamente, ver com clareza o que antes era obscuro, como uma aurora interior. Ideias e pensamentos amanhecem dentro de nós.

Dizer que os olhos de uma pessoa se iluminam quando ela tem uma percepção nova não é um clichê literário, é a luz deste alvorecer saindo pelos olhos.

Não sei se existe expressão parecida em outras línguas, mas ela deveria ser universal. Afinal, sua origem é a experiência mais comum da humanidade desde que ela viu, pela primeira vez, o sol afastando as trevas e a noite dando lugar ao dia, e à maior dádiva do dia, que é a de nos permitir enxergar.

O amanhecer é uma metáfora pronta, e reincidente. Nós a usamos para escrever a História: o Renascimento como um novo dia depois da noite medieval, o Iluminismo como o sol resgatando o espírito humano das sombras da ignorância e da superstição etc.

Mas tanto como figura de linguagem quanto como alegoria histórica, todo amanhecer tem sua consequência, também reincidente e inescapável.

Nenhum dia é para sempre, todo amanhecer anoitece. Não importa quantas auroras pessoais você experimentar, e quantas revelações e verdades vierem iluminá-lo por dentro, elas não são permanentes, nem farão muita diferença fora da sua pele.

A lição do mundo é que as auroras não duram. O que se vê por aí são fundamentalismos em conflito, religiões recaindo nos seus hábitos, sem trocadilho, mais retrógrados, as pessoas se retribalizando e acreditando em feitiços cada vez mais estranhos. Não é exatamente no que se esperava que desse a Idade da Razão, antes parece ser um fim de dia. Que noite está por vir, ninguém sabe.

Revelações

Muita gente descobriu o que queria dizer “felação” quando foi revelado o que a estagiária fazia no então presidente Clinton, no Salão Oval da Casa Banca, no fim do expediente.

Houve até uma discussão nacional sobre se, não havendo penetração, felação era ou não um ato sexual — que, segundo Clinton, não acontecera.

Ainda se sabe pouco sobre o que os russos gravaram, se é que gravaram, no quarto do hotel em que Trump se hospedou em Moscou e, supostamente, recebeu prostitutas para práticas sexuais pouco convencionais.

Dizem que quando for divulgado o que acontecia naquele quarto, muita gente vai enriquecer o seu vocabulário.

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