quinta-feira, 14 de abril de 2016

Ta na Hora do Poeta - Deus Negro - Neymar de Barros

Eu, detestando pretos. 
Eu, sem coração. 
Eu, perdido num coreto gritando, separação.

Eu, você, nós, nós todos cheios de preconceitos, 
fugindo como se eles carregassem lodo, 
lodo na cor, e com petulância, arrogância, afastando a pele irmã. 

Mas estou pensando agora, e quando chegar minha hora? 
Meu DEUS, se eu morresse amanhã de manhã, 
numa viagem esquisita, entre nuvens feias e bonitas...

Se eu chegasse lá e um porteiro manco como os aleijados que eu gozei, viesse abrir a porta?
E eu reparasse sua vista torta, igual aquela que eu critiquei, 
se a sua mão tateasse pelo trinco, como as mãos do cego que não ajudei,

se a porta rangesse, chorando choros que provoquei? 
Se uma criança me tomasse pela mão, criança como aquela que não embalei,
e me levasse pôr um corredor florido, colorido como as flores que jamais dei,

se eu sentisse o chão frio como dos presídios que não visitei,
se eu visse as paredes caindo como das creches e asilos que não ajudei,
e se a criança tirasse corpos do caminho,

corpos que não levantei dando desculpa que eram bêbados,
mas eram epilépticos; que era vagabundagem, mas era fome.
Meu DEUS! Agora me assusta pronunciar seu nome.

E se mais pra frente a criança cobrisse o corpo nu da prostituta que eu usei,
ou do moribundo que não olhei, ou da velha que não respeitei, ou da mãe que não amei?
Corpo de alguém exposto, jogado por minha causa,

porque não estendi a mão, porque no amor fiz pausa e deixei lá,
eu só dei desgosto, e no fim do corredor o início da decepção.
Que raiva, que desespero, se visse o mecânico, o operario, aquele vizinho,

o maldito funcionário, e até o padeiro, todos sorrindo não sei do que.
Ah! sei sim, rindo da minha decepção.
DEUS, não está vestido de ouro? Mas como? Está num simples trono?

Simples como não fui, humilde como não sou?
DEUS decepção, DEUS na cor que eu não queria...
Deus cara a cara, face a face, sem aquela imponente classe.....

DEUS simples...DEUS NEGRO.
DEUS NEGRO?
E eu racista, egoísta, e agora?

Na terra só persegui os pretos, não aluguei casa, não apertei a mão...
Meu DEUS, você é negro? Que desilusão!, será que vai me dar uma morada?,
será que vai apertar minha mão? Que nada. Meu DEUS você é negro?

Que decepção!... não dei emprego, virei o rosto, e agora?
Será que vai me dar um canto? Vai me cobrir com seu manto?
Ou vai me virar o rosto no embalo da bofetada que dei?

Deus, eu não podia adivinhar.
Porque você se fez assim? Porque se fez preto?
Preto como o engraxate, aquele que expulsei da frente de casa?

DEUS, pregaram você na cruz e você me pregou uma peça....
e eu me esforcei a beça em tantas coisas e cheguei até em pensar em AMOR....
mas nunca, nunca pensei em adivinhar sua cor!!!!!!

Autor : Neimar de Barros

Ta na Hora do Poeta - Biografia - José Henrique da Silva

BIOGRAFIA



Desperto hoje
Desfolhando o livro
Que, com meu pulsar, há cinqüenta anos ando a rascunhar...

Onde vou me descobrindo,
Onde vou me refazendo,
Vou ainda me conhecendo,
Vou me explorando, 
Me revelando,
Vou corajosamente me despindo.

Me percebendo 
Que como todos nessa viagem
Sou ímpar,
Misto de terra, mar, fogo e ar.

E sigo aos seres encantados
A reverenciar,
Tendo muito a agradecer,
Afinal, após algumas páginas mal escritas
Encontrei meu complemento, meu verdadeiro par.

E tomo susto ao me ler pai
De um guri de trinta anos,
Com a difícil missão de a ele ter que ensinar
Que todos, invariavelmente, nessa trajetória
Ao edificar sua história
Somos como a força determinada de um samurai,
Mas, em certos capítulos, claro, o direito temos
De escorregar,
E cair,
E se machucar,
Mas, também crer que tal qual o referido samurai
Nesta vida, a gente balança, balança, mas não cai...

Ainda desfolhando o atual capítulo,
Apesar dos outros já escritos,
Capto em mim a força que move o pião,
Às vezes doce,
Às vezes ácido feito um limão.


Cada vez mais entendendo a lição
Que o que mais vale nesta travessia
É apenas saber se doar,
Sabendo do outro, da companhia cuidar,..

Afinal, não sou bobo, 
E já entendi,
Que quando a escrita deste livro acabar,

- E atenção, inimigos sociais, isso ainda muito vai demorar! -

É apenas o que se vai levar ....

José Henrique da Silva 
14/04/2012