domingo, 25 de setembro de 2016

Artigo de Opinião - Você tem provas ? - Roberto Muylaert


Em vez de vergonha, despudor; em vez de se arrepender, vangloriar-se das conquistas

O DIA


Ocorre, na mais tenra idade,que a criança não tenha noção exata do conceito de propriedade, sendo frequente que apareça em casa com algum objeto do coleguinha, ou da escola, como caneta, giz, boné, álbum de figurinhas, merendeira, etc. No dia seguinte, a mãe aflita segue com o pequeno até a escola, e em meio a constrangidos pedidos de desculpas, devolve o material aliviado de seus legítimos donos.

Mais tarde, moças e rapazes deixam esse hábito, e o fato de algum adolescente levar o que não lhe pertence “por distração” leva a uma punição severa, que pode ser a expulsão da escola ou a demissão. Nessa fase surgem as sensações decorrentes do malfeito, que podem variar em tamanho e importância, mas que acabam se instalando na consciência do infrator, como culpa, pesar, remorso e arrependimento.

Qualquer pessoa pode se lembrar de ocasiões em que sentiu culpa por alguma ação ou palavra, gerando um peso na consciência que não passa, até ser redimido pelo perdão do atingido.

Mas há uma categoria que parece infensa a esses sentimentos: a dos políticos em geral, com as exceções de praxe.

Quando se ouve algum político manobrando em causa própria, em detrimento do país, percebe-se que, de duas uma: ou o cidadão imagina que jamais será atingido, ou já se habituou a assistir e/ou aderir a tantas manobras espúrias, que passa a achar normal as práticas de lesa-pátria e enriquecimento ilícito.

Em resumo, os termos que cabem a esses infratores sem culpa são: em vez de vergonha, despudor; em vez de se arrepender, vangloriar-se das conquistas; em vez de pesar, a alegria de quem conseguiu variados bens materiais; em vez de remorso, a sensação de esperteza por ter agido em causa própria.

O filósofo Immanuel Kant deixou para nosso uso o conceito de “imperativo categórico”, a liberdade de o homem ter ética própria, sem influência dos preceitos religiosos ou medo de punição, agindo de acordo com a própria consciência. Parece claro que os responsáveis pelos destinos do país nunca leram Kant. Se leram, não entenderam. Portanto, nada de pudor, culpa, arrependimento, remorso, vergonha. Tudo isso pode ser trocado pelo instrumento de defesa que interessa a todos: você tem provas?

Roberto Muylaert é editor e jornalista

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