quinta-feira, 12 de abril de 2018

Crônicas do Dia - Quando a tecnologia irá abalar a educação superior ?

No início da década de 1990, no início da era da internet, uma explosão da produtividade academica parecia estar ao virar da esquina. Mas essa esquina nunca apareceu. Em vez disso, as universidades ensinaram técnicas que permitem que estes se orgulhem de terem lançado ideias criativas que podem afectar o resto da sociedade, algo que tem vindo a evoluir a um ritmo glaciar.


Claro que as apresentações em PowerPoint substituíram os quadros negros, as inscrições nos "muitos cursos online" excederam frequentemente os 100.000 alunos (embora o número de estudantes empenhados tendesse a ser muito mais pequeno) e "as salas de aulas invertidas" substituíram os trabalhos de casa, sendo pedida a visualização de conferências gravadas, enquanto as aulas são passadas a debater os exercícios feitos em casa. Mas, dado o foco da educação no aumento da produtividade, não deveriam estes esforços para revigorar as economias escleróticas Ocidentais estar focados numa reinvenção da educação superior?

Os obstáculos sociais e políticos são grandes no ensino primário e secundário por isso podemos entender porque é que as mudanças precisam de tempo para ganhar raízes nestes níveis de ensino. Mas as universidades têm geralmente mais capacidade para experimentar; de facto, de muitas formas, é a sua razão de existir.

Por exemplo, que sentido faz que cada universidade nos Estados Unidos dê as suas palestras altamente idiossincráticas em áreas importantes como cálculo, economia e história norte-americana a turmas com 500 alunos ou mais? Por vezes, estas turmas gigantes são óptimas mas ninguém que tenha ido para a universidade pode dizer que isso não é a norma.

Pelo menos nos cursos de introdução, porque não deixar os alunos de todas as partes verem as gravações feitas com os melhores professores do mundo e com qualidade, como fazemos com a música, desporto e entretenimento? Isto não significa que há um cenário único: pode haver um mercado concorrencial, como já existe nos manuais escolares, com talvez uma dúzia de pessoas a dominar grande parte do mercado.

E os vídeos podem ser usados em módulos e a escola escolhe usar, digamos, um pacote para ensinar a primeira parte do curso e um pacote completamente diferente para ensinar a segunda parte. Os professores podem continuar a misturar nas aulas os seus tópicos favoritos, mas por prazer, não como uma rotina enfadonha.

A mudança para conferências gravadas é apenas um exemplo. O potencial para desenvolver software especializado e aplicações para os níveis mais elevados de ensino são infinitas. Já se realizaram algumas experiências com software para ajudar a entender os desafios individuais dos estudantes de forma a guiar os professores na forma como podem dar uma resposta mais construtiva. Mas até agora, tais iniciativas são limitadas.

Talvez uma mudança no ensino superior seja tão glacial porque a aprendizagem é profundamente interpessoal, fazendo com que os professores humanos sejam essenciais. Mas não faria mais sentido que a maioria do tempo de ensino nas faculdades fosse focada em ajudar os estudantes a aprenderem activamente através da discussão e exercícios, em vez de, por vezes, estarem a ver palestras que estão na centésima posição em termos de qualidade?

Sim, fora das universidades tradicionais, há algumas inovações notórias. A Khan Academy produziu uma colectânea rica em palestras sobre vários tópicos, sendo particularmente forte no ensino de matemática básica. Embora os principais destinatários sejam os alunos do ensino secundário, há muito material que os alunos do ensino superior (ou qualquer pessoa) pode descobrir que é útil.

Além disso, há alguns sites óptimos, incluindo o Crash Course e o Ted-Ed, que contêm vídeos pequenos de educação genérica em vários temas, desde a filosofia à biologia e à história. Mas, apesar de um pequeno número de professores inovadores estarem a usar tais métodos para reinventar os seus cursos, a enorme resistência que enfrentam por parte de outras universidades impedem o desenvolvimento do mercado e faz com que seja difícil justificar o investimento necessário para produzir uma mudança mais rápida.



É necessário entender que os docentes das universidades não estarão muito empenhados em ver a tecnologia a reduzir o número de empregos, tal como qualquer outro grupo não está interessado. E, ao contrário da maioria dos trabalhadores das fábricas, os docentes das universidades têm um enorme poder sobre a administração. Qualquer presidente de uma universidade que tente ignorá-los geralmente perde o seu emprego antes do qualquer docente.



Claro que as mudanças, eventualmente, vão chegar, e quando chegarem, o efeito potencial no crescimento económico e no bem-estar social vai ser enorme. É difícil sugerir um número exacto porque, tal como em muitas outras coisas no mundo tecnológico moderno, o dinheiro gasto na educação não representa o impacto social total. Mas mesmos as estimativas mais conservadoras sugerem um potencial vasto. Nos EUA, o ensino superior representa mais de 2,5% do PIB (cerca de 500 mil milhões de dólares) e, ainda assim, muitos destes gastos são ineficazes. Embora os custos reais não se traduzam num desperdício do dinheiro dos contribuintes, a verdade é que os jovens hoje podiam estar a aprender muito mais do que estão.



As universidades e as faculdades são cruciais para o futuro das nossas sociedades. Mas, dado os avanços impressionantes que estão a ser realizados em tecnologia e em inteligência artificial, é difícil ver como é que eles podem continuar a desempenhar este papel sem se reinventarem durante as próximas duas décadas. A inovação na educação vai disromper o emprego académico mas os benefícios para os empregos em todas as outras áreas podem ser enormes. Se houver mais disrupção na torre de marfim, as economias poderão tornar-se mais resilientes em relação à disrupção que vem de fora.



Kenneth Rogoff, que foi economista-chefe do FMI, é professor de Economia e Políticas Públicas na Universidade de Harvard.

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