"Chegou a hora de cuidar das pessoas", dizia o pastor Marcelo Crivella na campanha para a prefeitura do Rio de Janeiro. Ninguém pode acusá-lo de não cuidar do filho, Marcelinho Crivella, nomeado agora, para orgulho do papai, secretário da Casa Civil. O salário polpudo é o que menos conta. Marcelinho começa a ser preparado para ser eleito senador em 2018.
Tem cara de nepotismo, tem cheiro de nepotismo, é nepotismo por definição e semântica. É imoral, neste momento do país. Mas não é ilegal. O Supremo Tribunal Federal, numa súmula 13 que considero equivocada, autoriza nomear parentes para os mais altos escalões políticos, como ministros e secretários estaduais ou municipais. Soa como inversão de valores: quanto mais alto o escalão, mais censurável deveria ser a nomeação de um parente.
Nepotismo (do latim nepos, neto ou descendente) é o termo que designa favorecimento de parentes em detrimento de pessoas mais qualificadas. Marcelinho só está na posição-chave da Casa Civil por ser filho do homem. Nunca ocupou um cargo na gestão pública. Será responsável pela nomeação de 10 mil cargos comissionados. É um escândalo. Alguém da oposição deveria entrar com recurso, porque toda lei tem interpretações subjetivas. Não podemos apelar para um algoritmo salvador? Não há competência técnica comprovada de Marcelinho para essa função.
Crivella jurou “proteger a família” ao tomar posse. Está cumprindo a promessa: “Você precisa entender que ninguém conhece melhor meu filho. E quem nomeia sou eu”. Pouco sabemos sobre as qualidades de Marcelinho para o cargo. Mora nos Estados Unidos, é formado em psicologia cristã na Califórnia, casado desde 2011, e abriu uma rede de escolas de computação gráfica, Seven, que foi rebatizada de Red Zero. Uma palestra sua ensina como ganhar sempre numa negociação. Ah, e Marcelinho também gosta de pizza com rúcula.
A reação da sociedade teria sido mais branda se Crivella tivesse, de fato, assumido o desafiador papel de prefeito de um Rio em crise aguda pós-Olimpíada, nas finanças e na segurança. Onde está Wally? Crivella é invisível como prefeito. Começou mudando a logomarca da prefeitura, substituindo o azul de Eduardo Paes pelo “verde” no brasão e trocando as palavras de lugar. Gastar dinheiro com isso? É essa a austeridade prometida?
São mais de 30 dias de mandato e o que fez o prefeito do Rio além de decretar um mutirão de cirurgias? Até agora, não sei se Crivella vai mesmo cortar à metade as despesas com cargos comissionados e gratificações. Ninguém sabe, talvez nem ele. Quem está na prefeitura não sabe se vai continuar. Ao tomar posse, prometeu reduzir de 26 para 12 as secretarias, mas não consegue finalizar nada. Crivella não divulga balanço de um mês de administração. Não se pode denunciar uma obra irregular, porque não há diretores no Urbanismo. As praias estão mais bem patrulhadas? Sim, era o mínimo no verão carioca.
Crivella recuou de cinco nomeações após revelar os nomes. Nomeou e exonerou em 24 horas. Todos tinham problemas com a Justiça. Deveria cair em si e exonerar o vice-prefeito e secretário de Transportes Fernando Mac Dowell, dono de mansão que deve R$ 215 mil de IPTU e dono de empresa que deve quase R$ 235 mil de ISS à prefeitura e R$ 137.300 à União. Crivella diz que todo contribuinte tem direito de negociar sua dívida. Verdade. Mas um endividado compulsivo não pode ser vice-prefeito nem comandar o setor turbulento e carente do transporte. Não pode. Nem rezando para o bispo. Repetindo: Mac Dowell não tem ficha fiscal compatível com o cargo.
É óbvio que, como o PRB é um braço ou uma fachada política legal para a Igreja Universal, falta “corpo técnico”. Difícil governar somente em nome do pai, do filho e do espírito santo. Funcionários da prefeitura me disseram em off que Crivella faz uma gestão amadora, como se administrasse uma paróquia. E que acalenta planos como criar o Rio 10, a Saúde 10, a Segurança 10. Usando sempre seu número, que tentou até enfiar no brasão da prefeitura. Não sei se Crivella é adepto da numerologia, mas assumir a prefeitura seria um bom começo para o Rio acéfalo.
Quanto ao “Marcelinho”, Crivella padece do mesmo problema de muitos machos brasileiros, públicos ou privados. Primeiro, anseiam por ter filho varão. Depois, fazem questão de colocar seu próprio nome no bebê. E aí temos o Michelzinho (Temer), o Rodriguinho (Maia) e tantos outros. Muitos exibem os garotinhos como troféus de masculinidade. Querem cena mais deslocada e surreal que a de Rodrigo Maia erguendo o Rodriguinho na mesa da Câmara em Brasília, após ser reeleito presidente? Não há fronteira entre público e privado em nosso país. Falta compostura.
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