quinta-feira, 7 de setembro de 2017

Entrevista - Rita Lee - "Uma palhaça que faz graça até da desgraça"

POR CRISTINA FIBE 13/08/2017 


 RIO — Ela anunciou a aposentadoria dos palcos, se isolou em sua casa em São Paulo, reduziu o contato (presencial, ao menos) com imprensa e público. Mas a cantora e compositora Rita Lee, que chega aos 70 no último dia do ano, não parou de trabalhar. Primeiro, viu sua “Autobiografia” virar fenômeno de vendas ao ser lançada, em novembro passado. Meses depois, leva às lojas mais uma obra, “Dropz” (Globo Livros), desta vez uma reunião de 61 contos que misturam ficção e realidade e acompanham pequenos desenhos da própria autora.

Sobre o tom descrente e sarcástico com que aborda, no livro, temas como terrorismo, feminismo e política, Rita diz que é preciso ter uma “boa dose de humor, ou a velhice pode ficar amarga demais”. Em entrevista por e-mail, ela conta ainda que gostaria de se aventurar num romance policial (“sou boa em desvendar crimes, meu autor predileto é Rex Stout”), anuncia um filme para breve, escondendo qualquer detalhe, e não descarta voltar a lançar um disco de inéditas (“nunca parei de compor”), se a “preguiça de aposentada deixar”.

Quando foram escritos os contos de “Dropz”? Você sempre teve o hábito de escrever ou o seu afastamento dos palcos é que gerou o tempo para a nova atividade?

Depois que escrevi a bio bateu um vazio tipo pós-parto, e naturalmente minha cabeça começou a imaginar um novo filho. Foi só pegar meu iPad que os contos foram saindo sem que eu soubesse o final deles, uma surpresa até para mim. Sempre tive o hábito de escrevinhar, mas depois que me afastei dos palcos pude extravasar mais o côté escritora.

O sucesso comercial da autobiografia te estimulou a lançar o novo livro?

Muito antes da biografia, eu escrevia historinhas pelo Twitter. Algumas acabaram saindo num livrinho com ilustrações de Laerte (“Storynhas”, de 2013). Séculos atrás (nos anos 1980 e 1990), lancei três livrinhos infantis sobre as aventuras de dr. Alex, um ratinho que defende os direitos dos animais. E, sim, a biografia me deu mais segurança para escrever o “Dropz”.

O livro traz desenhos seus. Qual o espaço que a Rita artista plástica ocupa na sua vida?

Veja você que além de ter a cara de pau de me pretender escritora também me meti a fazer as ilustrações do “Dropz”. Estou sempre envolvida com tintas e pincéis, me faz passar o tempo com mais leveza.

Qual é a história por trás do quadro que ilustra a capa do livro?

A capa é um autorretrato que fiz para Roberto (de Carvalho, seu marido) há 20 anos e é como sempre me vi: uma palhaça que faz graça até da desgraça.

Você já disse que os contos são historietas reais num mundo paralelo. Depois de uma autobiografia de sucesso, quanto de sua própria experiência ainda há nessas linhas?

Algumas delas são meditações cotidianas, outras são loucuras que passaram pela cabeça, outras ainda sou eu querendo imitar La Fontaine.

Nos contos, você aborda temas como terrorismo e violência e fala em um país que é o “reino da putaria”. Esses contos refletem a sua maneira de ver o mundo e o Brasil hoje?

Aos 70 anos, observo o mundo ao redor e os paralelos com mais desapego, hay que tener uma boa dose de humor e sarcasmo, ou a velhice pode ficar amarga demais.

Um conto como “Ateu” reflete a sua própria descrença do mundo? A raça humana não deu certo, como escreve no texto?

Psicografei a cabeça de um ateu no mundo de hoje: ele ia me contando como enxergava algumas questões sobre o assunto e eu apenas anotei. Sou uma ateia que coleciona santinhos de todas as religiões e que percebe o divino através dos animais; nós, humanos, somos apenas coadjuvantes.

Como vê a crise política que o Brasil enfrenta? Há solução em vista?

A polarização tá muito chatinha, não confio em nenhum dos lados. O voto obrigatório é o grande vilão do Brasil.

Quem seria o presidenciável que teria o seu voto no ano que vem?

Nenhum dos pré-candidatos até agora me fará sair de casa para votar.

Em entrevista ao GLOBO, Ney Matogrosso comentou, sobre as homenagens que recebeu no Prêmio da Música Brasileira, que a convidou para estar no palco da festa, mas você recusou. Ele chegou a dizer que o Rio estava mesmo muito perigoso para você vir. Foi o medo da cidade que a motivou a dizer não? Qual é a sua relação com o Rio hoje?

Cara, eu só saio da minha toca em caso de incêndio, coisas de uma velhinha que ficou cansada de agitos. Homenageio Ney nas minhas meditações, nas minhas orações, Ney é meu Bowie tropical. Faz um bom tempo que não vou ao Rio, no século passado tive a honra de ganhar cidadania carioca, sou uma paulista que não deixa falarem mal do Rio. #voltacapitalparaorio


O seu afastamento dos palcos prevê uma exceção para comemorar seus 70 anos, em dezembro? Há algum plano para a data?

O plano é lançar em março um coffee table book me auto-homenageando com fotos e curiosidades da minha vida. Vou passar meu aniversário quietinha com minha família, meus bichos e minhas plantas.

Uma exposição de itens seus seria possível? Como preserva seu acervo?

Tenho um sótão abarrotado de lembranças, dia desses faço uma expo-baú do arco da velha.

O que mais há para brotar dos seus escritos? Você anda compondo também?

Nunca parei de compor; dia desses, se minha preguiça de aposentada deixar, posso até lançar um disquinho de inéditas... Pensando bem, um single é bem menos trabalhoso e mais objetivo. E ainda vem aí um filme... Ah, são tantas emoções...



Leia mais: https://oglobo.globo.com/cultura/livros/depois-do-best-seller-autobiografia-rita-lee-lanca-livro-de-contos-21700333#ixzz4rzm2OoRq
stest

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