A maior crise brasileira não está nas aparências do que nós vemos e sofremos, mas na nossa recusa de olhar para onde sopram os ares do futuro
28/05/2016 - 09h05
Há uma sensação geral de que o país perdeu o rumo. O incômodo vem de fatos específicos: caos político, corrupção, recessão, desigualdade, violência, epidemias, desemprego, deseducação, falência das contas públicas.
Poucos, porém, consideram que estes indicadores de falta de rumo e de decadência têm em comum o fato, ainda mais grave, de que estamos sem sintonia com o “espírito do tempo”, o conjunto de ideias que orientam a humanidade e cada nação para o futuro. É como se, além de rodando no meio do mar, não soubéssemos como inflar as velas do barco na direção dos ares que sopram para o futuro.
Não é a primeira vez que isso acontece. Quando o mundo ingressava na primeira revolução tecnológica, com capital industrial e trabalho assalariado dentro das regras do mercado, nós optamos por continuar escravocratas, patrimonialistas, ruralistas, exportadores de bens primários, obscurantistas no pensamento.
Cem anos depois, quando iniciamos nossa industrialização, passamos a fabricar velhos produtos, não nos dedicamos a inventar produtos novos, conforme os novos tempos que já se iniciavam.
No século XXI, outra vez estamos dessintonizados com ares do tempo: a revolução científica, o capital conhecimento e a inovação como motores do progresso. Continuamos emergindo ao passado, não ao futuro: comemoramos continuar exportando commodities e fabricando autos, sem desenvolver capacidade de inovação para criar novos produtos da economia do conhecimento, sem base científica e tecnológica, sem colocar o bem-estar na frente de produção, consumo e renda, sem compromisso com o equilíbrio ecológico.
Vemos a tragédia imediata da recessão e do desemprego ao redor, mas não percebemos a tragédia distante de continuarmos na velha economia da produção primária, da indústria metal-mecânica, da dupla dependência tecnológica, tanto na inovação dos produtos quanto na inovação das ferramentas.
A maior prova da falta de sintonia com o futuro é o descuido como tratamos nossa educação de base, desperdiçando milhões do mais importante vetor do futuro: os cérebros bem formados de nossa gente. O vetor do progresso está na educação de qualidade igual para todas as crianças, independentemente da renda dos pais e da cidade onde vivem.
Desprezamos o futuro quando nos recusamos a prestigiar o mérito dos bons professores, diferenciando-os dos demais. Não estamos sintonizados com o futuro ao mantermos uma máquina estatal ineficiente, a serviço de sindicatos e partidos, e não do público; ou quando nos recusamos a atualizar velhas leis que já estão superadas.
Nos tempos em que a taxa de natalidade diminui e a esperança de vida aumenta, o espírito do tempo exige reforma no sistema previdenciário.
A maior crise brasileira não está nas aparências do que nós vemos e sofremos, mas na nossa recusa de olhar para onde sopram os ares do futuro e como fazermos as reformas que nos sintonizarão com ele. Estamos desorientados com o presente caótico e outra vez não nos sintonizamos com as forças do espírito do tempo
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