Segunda-feira, 16hs. Regina Duarte diz que está noivando com Bolsonaro, indicando que aceitará o convite para suceder a Roberto Alvim. Comparo as fotos em que ela posa com o nosso atual presidente nacional-populista de extrema-direita a uma outra, dos anos 1970, em Havana, ao lado do ditador cubano Fidel Castro. O sorriso nas duas imagens é o mesmo, se bem que o atual parece um pouco amarelo.
No tempo em que esteve em cuba, Regina lutou contra a censura no Brasil. Será que, empossada, pactuará com a versão de que o regime militar não foi uma ditadura, propalada por Jair Bolsonaro e grande elenco, em meio a loas a torturadores?
Semana passada, num post no Instagram, Regina disse, em referência ao documentário “Democracia em vertigem” (que é apenas um filme, não uma política de governo, e não teve nenhum incentivo) que “nenhum Oscar vai reescrever a nossa História”. Para provar que está engajada na lisura da nossa história será agora preciso que ela diga não aos tais “filtros” (um dos fetiches do governo) nos critérios de fomento a obras que discorram sobre os anos de chumbo, ou sobre qualquer assunto, sejam elas de que coloração forem. E que, como artista, saiba que História se escreve com base em uma pluralidade de análises, cruzadas com a factualidade dos eventos.
Por estes dias, ventilou-se que Regina só aceitaria o cargo se tivesse autonomia. É preciso que alguém lembre a ela que, no governo Bolsonaro, só tem autonomia quem reza (no sentido literal, inclusive) pela sua cartilha, como era o caso de Alvim, que tinha carta branca para purificar a cultura nacional. Deu no que deu.
Mais difícil ainda é crer na viabilidade de seu declarado esforço para pacificar a relação entre Bolsonaro e a classe artística. Primeiro precisa combinar com Bolsonaro, inimigo da nata das artes, e com a própria classe artística. A DR do século. Para fazer Bolsonaro recuar de seu ódio aos maiores nomes da música, do cinema, do teatro, será preciso que este seja um noivado de mil e uma noites. Ou que Regina tenha poderes de Marvel.
A atriz, que no período da abertura subira a palanques com Lula, lançou, em setembro de 2002, a frase “Eu tenho medo”. Uma vez vitorioso, Lula reagiu com “A esperança venceu o medo”. Jogo jogado.
O que espanta, hoje, é que a atriz, que em 2019 postou imagens promovendo a campanha para o fim do STF, não sinta medo de entrar na máquina bolsonarista. Terá que conviver com ideias torpes contra as quais, um dia, teria lutado.
Nas artes, a namoradinha do Brasil evoluiu para Malu Mulher, passando de símbolo do amor romântico a ícone da liberação feminina. Se, no atual governo, realizar algo equilibrado, respeitoso de seus pares e à altura de nossa riquíssima memória cultural sem ser fulminada pelo presidente, terá produzido um milagre.
É preciso que Regina se pergunte se, na transição atual, terá lucidez para, caso necessário, dar uma nova guinada na direção da razão. Ela tem um nome a zelar.
Arnaldo Bloch - O Glogo - 21/01/20
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