Culpar governos passados, ou o bode expiatório da vez, uma hora perde a força. Em 2021, alunos brasileiros com 15 anos de idade farão o Pisa, uma avaliação de aprendizagem realizada pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), e em 2022, conheceremos sua pontuação. Será difícil escapar da responsabilidade pelos resultados de uma avaliação independente. O governo atual tem de decidir logo (e já com atraso) se manterá o rumo atual — ideológico e ineficiente — ou se fará um compromisso efetivo com estados e municípios em prol da aprendizagem dos alunos, que são brasileiros, não federais, estaduais ou municipais.
O Ministério da Educação (MEC) segue errático em suas iniciativas, mostrando constância apenas na atribuição de culpa a governos anteriores, a Paulo Freire, aos professores, à balbúrdia etc. Infelizmente, problemas sociais não acabam quando findam os mandatos e, se negligenciados, crescem. Que tal unir esforços em vez de só apontar o dedo?
Há muito a ser feito. Estão em curso discussões importantes para fazer avançar a educação básica brasileira que exigem máxima atenção, pois definirão as oportunidades dadas a milhões de crianças e jovens. A despeito da apatia estratégica da gestão federal, alguns atores já entenderam isso.
O Congresso Nacional — em especial o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM) — já compreendeu que o ano traz oportunidades ímpares, como garantir maior eficiência e mais recursos para os alunos mais vulneráveis com a reformulação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação); assegurar uma trajetória escolar com menos percalços a partir da aprovação do verdadeiro Pacto Federativo da educação — o Sistema Nacional de Educação (SNE) — e, por fim, colocar de vez na agenda nacional o desenvolvimento infantil pleno com o início do Biênio da Primeira Infância (2020-2021).
É preciso aprofundar esses debates, tomando cuidado com os possíveis retrocessos. Um deles diz respeito ao Fundeb, discussão que o MEC pretende devolver à estaca zero. Não podemos deixar que seja ignorado o diálogo sobre o assunto construído nos últimos três anos, nem que haja prorrogação do prazo do Fundo sem mudanças. Menos ainda aceitar seu desaparecimento. Protelar a reformulação do Fundo é colocar a melhoria da educação em suspenso; e acabar com ele, promover o caos. Não instituir o SNE, por sua vez, é apostar na descoordenação entre os níveis de governo.
No campo do Executivo, os governadores vêm intensificando seu protagonismo em temas como alfabetização, carreira docente e ensino médio. Muitos estados, como Pernambuco, Espírito Santo, Amapá, Sergipe, estão implementando junto aos municípios políticas de alfabetização inspiradas no sucesso do Ceará.
O governo federal, por outro lado, prometeu um programa nacional de alfabetização como meta de 100 dias, mas divulgou apenas a Política Nacional de Alfabetização (PNA) —genérica e sem estratégia de implementação. Desde então, pouco tem dialogado com um espectro amplo de especialistas ou com os gestores municipais, principais responsáveis pela alfabetização. Será preciso articular a PNA aos programas já em funcionamento nos estados.
Ademais, em 2020, será crucial assegurar que as pautas relevantes da educação — e não sua defesa genérica — sejam prioritárias para os novos prefeitos a serem eleitos em outubro.
É tempo de decidirmos como o ano de 2020 será lembrado. Apenas como uma coincidência numérica que ocorre a cada século ou como o ano em que o Brasil decidiu priorizar efetivamente a educação básica? A história do ensino básico neste ano dependerá muito da ação do MEC. Se continuar como hoje, não terá parte dos sucessos, mas será responsabilizado por eventuais fracassos. É uma escolha.
Priscila Cruz é presidente-executiva, e João Marcelo Borges é diretor de estratégia política do Todos Pela Educação
Fonte: artigo publicado pelo Globo em https://oglobo.globo.com/opiniao/educacao-as-desculpas-vao-perder-forca-24201650
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