terça-feira, 6 de junho de 2017

Crônicas do Dia - Os mais interessados

Karen é uma estudante de ensino médio da periferia de uma grande cidade que, até o ano passado, convivia com uma biblioteca escolar fechada. Não saíam os livros, não entravam os alunos. A fim de democratizar o acesso ao local, a jovem e o grêmio estudantil da unidade iniciaram uma campanha pela abertura do espaço. Por mais positiva que fosse a pauta, o diálogo não ocorreu sem ruídos. A direção recusou-se a negociar, e a situação avançou a custo de muita insistência e argumentação dos estudantes. Em uma oficina sobre diálogo na escola, a jovem desabafou: “Não há espaço para a escuta, só para a burocracia e os resultados”.


A visão de Karen não é exclusiva dos grupos organizados da juventude, como mostra a pesquisa Repensar o Ensino Médio, iniciativa do Todos Pela Educação, com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Itaú BBA, cujos resultados foram publicados em primeira mão pelo GLOBO no início deste mês. Para 90% dos jovens brasileiros de 15 a 19 anos entrevistados, a mobilização pela melhora escolar deveria ser feita principalmente por meio do diálogo na escola — com a participação deles —, em vez de ser algo restrito aos governos e secretarias de ensino.

Essa juventude também aponta direções para mudar o Ensino Médio, com particularidades nas diferentes regiões do país — o que reforça a importância do diálogo local. Para os estudantes da rede pública da Região Sudeste, por exemplo, os atributos mais importantes da escola dessa etapa são a atenção às pessoas com deficiência e a escuta por parte da direção. Já na Região Norte, os principais atributos são a segurança — o que significa menos violência, brigas e bullying — e professores sempre presentes.

Ao apresentar sua voz sobre a educação, a juventude passa a contribuir de forma mais robusta para que as mudanças educacionais tenham mais êxito e maior aderência da comunidade escolar. Os jovens vivenciam no dia a dia os desafios da aprendizagem — e são os principais interessados em um ensino médio de qualidade.

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No documentário “Nunca me sonharam”, uma iniciativa do Instituto Unibanco, uma das personagens sintetiza como a falta de qualidade do ensino contribui para o aumento da desigualdade entre as diferentes juventudes brasileiras: “Sou negra, moro em Caxias e, ainda por cima, não estudei em uma boa escola, a junção dessas três coisas não me deixarão concorrer a boas colocações”.

Falas como essa revelam que a identidade e a trajetória escolar são relevantes para os jovens e que eles querem falar sobre isso. Abrir possibilidades para que eles expressem suas demandas de forma qualificada pode significar a força de apoio necessária para que a sociedade e os governos realizem reformas que melhorem de fato a qualidade do ensino.

Caio Callegari, Carolina Fernandes e Pricilla Kesley são integrantes do movimento Todos Pela Educação



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