Nesta semana dei um jantar para amigos. Só seis pessoas, para bater papo. Rir. Também exibir minhas qualidades culinárias, embora atualmente eu não cozinhe muito. Amo culinária. E me comporto como um chef malvado com minha funcionária, Sandra. Digo o que tem de fazer. E depois agradeço os elogios, modestamente, como responsável por cada grãozinho de arroz. Desta vez, um amigo trouxe outro, a quem não conhecia. Gentil, trouxe uma garrafa de vinho. Agradeci. Outro trouxe chocolate, e quase devolvi. Todo ser humano que vê as redes sociais sabe que vivo em perpétuo regime. Mas há duas coisas que até meu melhor amigo gosta de fazer. Primeiro, dizer que estou gordo. Depois, quando entro em regime, oferecer chocolates, bolos, doces e acabar com minhas boas intenções magras. Com a frase:
– Uma vez só não tem importância.
Ódio! Enfim, voltando ao jantar. Separei três garrafas de vinho. Confesso: levemente fora da validade. Acho tão espinhoso esse tema da validade! É pior que taxas de colesterol. Vivem mudando prazos de consumo e índices de saúde. Rapidamente, foram-se as três garrafas. Considerando o jantar por terminado, ofereci vinho do Porto. Foi a garrafa inteira. Percebi que o responsável era um só, o desconhecido. Virava as taças como se fossem de água. Foram todos fumar no terraço. Uma tábua estalou. Ele acusou outro convidado, que tem uma prótese de titânio na perna.
– É o peso da sua prótese!
Seguiu-se uma longa discussão sobre a possibilidade de roubar a prótese e vender o titânio a peso. O da prótese se escondeu na sala. Mantive um sorriso simpático enquanto imaginava as várias maneiras de botar o bêbado para fora de casa, dentro das normas de etiqueta. Mas há etiqueta para bêbados? Aí ele me chamou para a cozinha.
– Tem mais vinho?
Quis disfarçar. Disse que tinha separado só as garrafas do jantar. As outras estavam trancadas num lugar, do qual eu não tinha a chave. Mentira rasgada. Aparentemente ele acreditou. Mas lá estava, diante de nós, a garrafa que ele próprio havia trazido.
– Posso abrir o que você trouxe – ofereci.
Ele aceitou imediatamente. Tentei não achar o abridor. Rapidamente ele abriu as gavetas da cozinha e encontrou. Encheu a própria taça. Ninguém mais estava bebendo, portanto ele deu conta sozinho. Tenho várias caveiras em casa, obras de arte na verdade. Talvez irritado com minha cara de paisagem, ele atacou.
– Você gosta de caveiras, não é?
– Gosto, é uma tendência de arte contemporânea.
– Por isso você é igual a uma – cumprimentou-me.
– Desculpe, mas você está olhando para um espelho –respondi.
Ele foi atacar o próximo. Suspirei. Quem bebe demais gosta de dominar a situação. Os outros não conseguem conversar. Tenho vários amigos assim. Bebem uns tragos a mais e fazem um discurso na mesa. Já vi acontecer até em festa de trabalho. A funcionária dá um show, quase faz um striptease e puxa a barba do presidente da empresa. Tudo bem, é festa. Mas isso não vai contar, mais tarde, na carreira? Vai. Já tentei arrancar vários amigos de roubadas, enquanto dançavam no chão, de joelhos. Aprendi. Melhor fugir. Quem bebe demais fica incontrolável. Então, naquele jantar, diante de um bêbado sem noção, desconhecido, que fazer? Chamei minha cachorra para brincar, na esperança de que mordesse alguém. Para meu horror, ela adorou. E ainda aproximou-se das tacinhas de vinho do Porto e lambeu os restos. Descobri que minha husky siberiana tem tendências ao alcoolismo e também perde a noção, porque fez xixi no tapete turco. A noite passava. Duas da manhã. Três. O que deu carona queria ir embora. O outro não deixou, estava brincando com minhas obras de arte como se fossem pedras de dominó. Tentávamos iniciar um assunto, ele intervinha:
– Não é nada disso.
Já cuidei de alcoólatras. Convenci pessoas a frequentar os Alcoólatras Anônimos. Mas é impossível lidar com um bêbado eventual. O último foi um amigo que pegou carona comigo após um almoço regado a vinho na Serra da Cantareira, em São Paulo. Com problemas na vida, falava chorando e me abraçando, enquanto eu tentava segurar no volante para não despencar serra abaixo.
Impossível lidar com um bêbado. Quem bebe demais fica sem noção. Por isso gosto dos americanos. Quando chega a hora de terminar, o anfitrião avisa:
– Estou indo dormir, chamo um táxi para vocês?
É isso. Só há um jeito de lidar com um bêbado se você quer aproveitar a noite. Bota pra fora.
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