Dezembro é um mês perigoso. Nele, surgem mágoas e, pior, famas que grudam na pele da gente. Já contei mil vezes: certa vez, no amigo secreto (ou oculto, como preferem os fluminenses), tirei um grande amigo. Comprei uma camisa em promoção. Ele adorou! Mas a camisa não serviu. Fiquei de trocar. Não trocavam. Eu estava sem grana e enrolei meses, embora ele reclamasse todo dia. Fiquei com fama de pão-duro. Pior, de enrolão. Era uma fama justa, mas quem deseja ter? Amigos secretos são armadilhas. As pessoas escrevem e fazem charme anonimamente. Estipula-se o valor do presente, mas ninguém espera, na real, ganhar coisa baratinha. Presentes têm uma aura de romantismo. Crianças raramente querem roupa, a não ser meninas starlets. Querem brinquedos ou gadgets eletrônicos. Adultos? Chatíssimo receber um CD que não tem a ver no amigo secreto do trabalho. E ainda sorrir por obrigação:
– Adorei!
Só se dá CD quando a pessoa ama aquele cantor ou música. Livro, se gosta de ler. Mãe sofre, porque vira e mexe ganha liquidificador ou outro eletrodoméstico. A minha, coitada, avisava:
– Este ano quero presente para mim, não para a casa.
E vinha o liquidificador novo. Ela disfarçava.
– Eu estava mesmo precisando!
Botava na prateleira com mais cinco.
Um amigo certa vez se esmerou na falta de tato. Deu um pacote de fraldas para a amiga secreta, porque estava grávida.
– É útil.
Presente não tem de ser útil, mas encantador (claro, se alguém me der um Porsche, mudo de ideia). Todos têm ao menos 1 litro de romantismo no sangue! Fiz aniversário há pouco tempo. Ganhei presentes especiais, de pessoas especiais. Um par de corujas de porcelana, com uma carta segundo a qual a coruja é símbolo de sabedoria. E afirmando que eu lembro uma coruja. Não pelos olhos esbugalhados, espero. Mas por ficar acordado até tarde, meditando. Um amigo me ofereceu uma réplica do anão de Game of Thrones. Sou apaixonado pela série (não sei como se fala anão de forma politicamente correta. Em todo caso, qualquer que seja a palavra que eu use, a altura continuará a mesma). Recebi também um Edward mãos de tesoura incrível! Um kit de boas energias com incenso, de minha sobrinha Juliana. Minha sobrinha Andrea, a traidora, trouxe uma caixa enorme de brigadeiros. É uma pequena traição para um tio guloso, eternamente em regime. Mas também amor.
Presente é isto: um ato de afeto. Uma amiga está com os dedos espetados de tanto bordar. Motivo: os netos surgem por todos os lados. Há genros, filhos. Só falta grana. Está fazendo ela mesma os presentes de Natal. Eu instalei uma colmeia em casa. Já fiz três colheitas, cada uma com sabor diferente. Colhi um mel doce, saboroso. Vou distribuir potinhos de mel! Pensei em fazer geleia de jaca. Senti rejeição. Há um preconceito enorme contra a jaca. Ainda surgirá uma ONG para defender a jaca. Já tive uma amiga que fazia biscoitos e enviava em latinhas. Eram presentes superapreciados. Uma delicadeza.
Um erro que já cometi, e do qual fujo atualmente, é passar presente para a frente. Tudo o que pode dar errado dá errado, diz a lei de Murphy. A última vez foi num amigo secreto de família. Eu havia ganhado de aniversário uma linda pasta de couro. Muito acima do valor estipulado na época. Meu amigo era um rapaz que mal conhecia, da família de minha sobrinha. Meu assistente Felippe e eu viramos a pasta de alto a baixo, à procura de um cartão de quem me dera. Não havia.
– O cartão deve ter vindo do lado de fora do pacote – concluiu Felippe.
Ah, como me assustam soluções que resolvem o problema com um “deve ter”. Embrulhamos a pasta e ofereci, na hora da festa. Ele abriu extasiado, veio o avô olhar e nesse momento, em cima da pasta, exatamente em cima, estava um cartão para mim da pessoa que tinha me dado. Nem uma aranha seria tão rápida quanto meus dedos. Juro, empalmei o cartão tão depressa que eles não viram! Mas e o frio na barriga? E o constrangimento? De fato, não deveria nem me sentir mal. As pessoas passam presentes para a frente o tempo todo. Já recebi vários que ofereci antes! As pessoas esquecem e dão de volta! Dá raiva! Fica a dica. Se não souber o que dar, um vinho ou champanhe sempre rola. É caro? Ofereça uma vela branca para ser acendida no Réveillon. Ou um desenho que você fez. Simples, concordo. Mas o valor do presente é sentimental, não financeiro. Presente assim fala ao coração, fica na memória afetiva! No mínimo, você não receberá olhares magoados no próximo ano!
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