Rio - "A Fórmula 1 não esquece Ayrton Senna". A frase foi publicada na imprensa internacional, como sinal de reverência a mais um aniversário da morte do piloto, ocorrida em primeiro de maio de 1994, depois de um acidente em Ímola, durante o GP de San Marino. Decerto, o Brasil também não o esquece.
Quando Senna competia nas pistas mundo afora, havia uma crise nacional moral e econômica. O desapontamento e a desesperança dilaceravam o brasileiro e traziam uma espécie de baixa autoestima cívica. O panorama era adequado para o surgimento de um herói no imaginário das pessoas. Senna ocupou esse lugar.
Alguns cenários políticos onde faltam exemplos a serem seguidos são propícios para o surgimento de heróis nacionais nos esportes ou em outras áreas, principalmente por conta da cultura da personalidade, existente em sociedades carentes de instituições fortes e idôneas, que defendam o cidadão. Sergio Buarque de Holanda, em seu livro 'Raízes do Brasil', descreve que nos países onde predominou o tipo de organização política artificialmente mantida por força exterior, surgiram hierarquias fundamentadas em privilégios para classes abastadas.
Os traços hereditários de uma sociedade estão sempre sendo assimilados quando encontram condições para o seu ajuste ao modo de vida vigente. Assim, adquirimos características dos anos de doutrina e costumes que nos forjaram ao seu modo, de acordo com os poderes que um dia nos dominaram.
Para um povo com tais propriedades, é natural que em lugar de políticos os heróis sejam atletas ou pessoas que superaram grandes adversidades. Ayrton Senna não foi apenas um grande piloto do automobilismo mundial. Ele foi um brasileiro que não tinha acanhamentos para assumir com orgulho sua Pátria. De certa forma, suas vitórias homenageavam a nação.
Acredito que, hoje, apesar de muitas semelhanças com aquela época, não há como cultivarmos heróis solitários, pois aprendemos que uma nação é edificada no exercício ético dos diferentes atores sociais. Não precisamos de heróis, precisamos de educação, saúde, trabalho, ciência, pesquisa e ações que nos tragam respeito e orgulho. Precisamos de pessoas que assumam com convicção o seu papel na reconstrução política do país, que começa individualmente, com maiores ou menores atitudes, com participação cidadã e coletiva, mesmo em tempos de caos.
Eugênio Cunha é professor e jornalista
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