24/04/2016
Por que uma pessoa coloca dinheiro fora do país e em lugares que lhe asseguram anonimato e isenção de impostos?
O DIA
Rio - Tudo que se passa dentro da casa, diz o Evangelho, será proclamado nos telhados. Agora aconteceu com 11,5 milhões de contas secretas guardadas, durante 40 anos, no escritório de advocacia Mossack-Fonseca, no Panamá. É o escândalo conhecido como Panama Papers.
São contas de offshore, que significa, em tradução livre, ‘negócios à parte’. Offshore é uma empresa legalmente constituída fora do país de quem investiu seu capital. Portanto, ter contas offshore não constitui crime.
O que levanta suspeitas é o fato de, em geral, a offshore ser aberta em paraísos fiscais ou países que não cobram impostos. Assim, garante-se o anonimato quanto à nacionalidade dos correntistas, que não precisam declarar essa renda à Receita Federal de seus países.
A revelação das contas permite que se compare a fortuna guardada no Panamá às fontes de renda e ao patrimônio dos seus donos. Eles terão de comprovar que as contas não escondem dinheiro de corrupção, negócios ilícitos ou evasão fiscal. É evidente que se fica com a pulga atrás da orelha. Por que uma pessoa coloca seu dinheiro fora do país, e exatamente em lugares que lhe asseguram anonimato e isenção de impostos?
Na lista da Panama Papers aparecem, por enquanto, 57 brasileiros, entre os quais Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados; Edison Lobão, ex-ministro de Minas e Energia; e o cantor Roberto Carlos. Em janeiro deste ano, a Oxfam, ONG britânica, revelou que apenas 62 pessoas no planeta possuem renda igual à de 3,6 bilhões de pessoas, metade da população mundial. Esses multimilionários escondem em paraísos fiscais 7,6 bilhões de dólares e 26 bilhões de euros!
As desigualdades sociais crescentes na maioria dos países agora são vistas com preocupação, pois requerem altos gastos em redes de proteção social e estimulam todo tipo de violência, inclusive o terrorismo. De 200 empresas que participam anualmente do Fórum Econômico Mundial, de cada dez, segundo a Oxfam, nove guardam fortunas em paraísos fiscais dos EUA ou da Europa.
Um projeto em estudos pelo governo dos EUA é acabar com o dinheiro físico, o papel moeda, e utilizar apenas dinheiro virtual, como cartões de crédito e transações por internet. Isso tornaria as transações mais facilmente controláveis por bancos e governos. Como alerta o jornalista cubano Luis Manuel Arce, seria como se cada cidadão tivesse um microchip sob a pele...
Frei Betto é autor do romance policial ‘Hotel Brasil’ (Rocco)
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