A mídia nos bombardeia diariamente com as previsões de especialistas sobre o futuro. Esses experts mais erram do que acertam, mas nem por isso deixamos de recorrer a eles sempre que o horizonte se anuvia. Como explicar o paradoxo?
Uma boa tentativa é o recém-lançado livro do escritor e jornalista Dan Gardner. As passagens mais divertidas do livro são sem dúvida aquelas em que o autor mostra, com exemplos e pesquisas científicas, quão precária é a previsão econômica e política.
Num célebre discurso de 1977, por exemplo, o então presidente dos E.U.A., Jimmy Carter, ancorado nos conselhos dos principais experts do planeta, conclamou os americanos a reduzir drasticamente a dependência de petróleo de sua economia, porque os preços do hidrocarboneto subiriam e jamais voltariam a cair, o que inevitavelmente destruiria o “American way” . Oito anos depois, as cotações do óleo despencaram e permaneceram baixas pelas duas décadas seguintes.
Alguém pode alegar que Gardner escolhe de propósito alguns exercícios de futurologia que
deram errado apenas para ridicularizar a categoria toda.
Para refutar essa objeção, vamos conferir algumas abordagens do problema.
Em 1984, uma revista britânica pediu a 16 pessoas que fizessem previsões sobre taxas de crescimento, câmbio, inflação e outros dados econômicos. Quatro dos entrevistados eram exministros de finanças; quatro eram presidentes de empresas multinacionais; quatro, estudantes de economia de Oxford; e quatro, lixeiros de Londres. Uma década depois, as predições foram contrastadas com a realidade e classificadas pelos níveis de acerto. Os lixeiros terminaram empatados com os presidentes de corporações em primeiro lugar. Em último, ficaram os ministros – o que ajuda a explicar uma ou outra coisinha sobre governos.
A razão para tantas dificuldades em adivinhar o futuro é de ordem física. Nós nos habituamos a ver a ciência prevendo com enorme precisão fenômenos como eclipses e marés. Só que esses são sistemas lineares ou, pelo menos, sistemas em que dinâmicas impostas pelo caos podem ser desprezadas. E, embora um bom número de fenômenos naturais seja linear, existem muitos que não o são. Quando o homem faz parte da equação, pode-se esquecer a linearidade.
Nossos cérebros também trazem de fábrica alguns vieses que tornam nossa espécie presa fácil para adivinhos. Procuramos tão avidamente por padrões que os encontramos até mesmo onde não existem. Temos ainda compulsão por histórias, além de um desejo irrefreável de estar no controle. Assim, alguém que ofereça numa narrativa simples e envolvente a previsão do futuro pode vendê-la facilmente a incautos. Não é por outra razão que oráculos, profecias e augúrios estão presentes em quase todas as religiões.
Como diz Gardner, “vivemos na Idade da Informação, mas nossos cérebros são da Idade da
Pedra”. Eles não foram concebidos para processar o papel do acaso, no cerne do conhecimento científico atual. Nós continuamos a tratar as falas dos especialistas como se fossem auspícios divinos. Como não poderia deixar de ser, frequentemente quebramos a cara.
HÉLIO SCHWARTSMAN
Adaptado de www1.folha.uol.com.br, 30/06/2011
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